Cidade de Triunfo, sertão de Pernambuco (Divulgação/Prefeitura Municipal de Triunfo).
No dia 15 de novembro de 1889, o Brasil passava por um golpe militar que instaurou o regime republicano no país, o que provocou significativas mudanças estruturais na organização política da monarquia para a república, defendida por alguns intelectuais positivistas e por setores do exército insatisfeitos com a Coroa desde o fim da Guerra do Paraguai. Nas províncias, que agora passariam a ser chamadas de "estados", as reações ocorreram de maneiras diversas e em Pernambuco não foi de modo diferente. Na época, o Partido Republicano em Pernambuco estava dividido em duas facções no Recife: a dos Republicanos Históricos, que constituíam os defensores da causa da república desde o período imperial e chefiados por José Isidoro Martins Júnior, e os Autonomistas, que era integrado pelos antigos políticos monarquistas e liderados pelo Barão de Lucena e por José Mariano Carneiro da Cunha, personagens de grande participação nos principais partidos do Segundo Reinado: o Conservador e o Liberal, respectivamente. Estes dois políticos autonomistas aliaram suas forças juntas ao governo federal e garantiram benefícios para sua ala do partido no início da república.
Com a posse do presidente Floriano Peixoto em novembro de 1891, este tratou de realizar mudanças nos governos estaduais, o que deu uma oportunidade para os Republicanos Históricos, apoiados pelo exército, atacarem o governo autonomista, agravando o cenário político do estado. Como uma tentativa de apaziguar os laços, o presidente Floriano nomeia o capitão Alexandre José Barbosa Lima como novo presidente do estado, este sem ligação com nenhuma das duas facções, o que não agradou o grupo dos Republicanos Históricos de Martins Júnior, que esperavam maior concentração de poder no estado após as rebeliões contra os autonomistas. O próximo empenho de Barbosa Lima seria organizar as eleições para a nova composição da Assembleia Legislativa, além dos intendentes municipais. Os aliados de Martins Júnior planejaram o boicote a estas eleições.
Os municípios pernambucanos que tornaram-se palco dessas rebeliões foram os de Goiana, Canhotinho Afogados da Ingazeira, Flores, Salgueiro, Vila Bela (atual Serra Talhada) e, por fim, Triunfo, onde ocorreu uma das maiores revoltas em 1892 contra o governo de Barbosa Lima, minuciosamente organizada pelos Republicanos Históricos, tendo por objetivo derrubar o poder estadual e a intervenção de Floriano no estado, escolhendo um novo nome com capacidade para pacificar o interior de Pernambuco. Contudo, o presidente do estado não viu tal ação com bons olhos. Forças leais ao governo de Barbosa Lima não tiveram dificuldades em repelir rebeliões em outras partes do estado, exceto em Triunfo, onde o "Movimento Patriótico de Triunfo", organizado por Martins Júnior, pelo Coronel Antônio Gomes Correia da Cruz, pelo padre Laurino Douette e outros partidários dos Republicanos Históricos, ofereceu uma resistência mais brusca ao governo estadual. Entre os apoiadores, estavam também membros da Guarda Nacional.
Os mantimentos de provisão para os combatentes rebeldes de Triunfo eram fornecidos por fazendeiros e demais habitantes da região do Pajeú, com apoio financeiro para o arsenal bélico vindo também da capital através do próprio Martins Júnior. As armas chegavam a cidade através de Princesa, município vizinho no estado da Paraíba. Para Triunfo, Barbosa Lima envia cerca de 150 soldados, tendo sido a primeira vitória dos rebeldes contra o governo em 21 de setembro. A Gazeta da Tarde, órgão de imprensa no estado, fora proibido de noticiar as derrotas da polícia estadual. Os embates, segundo o Coronel Correia da Cruz descreveu anos após a revolta, costumavam ocorrer sob táticas de guerrilha, amplamente utilizadas pelos rebeldes. Por isso, o maior choque entres as forças rivais foi de aproximadamente 30 minutos de tiroteios. O coronel ainda relatou que seus comandados passaram por momentos de ausência de abastecimento e de quatro dias sem alimentos, sendo obrigados a dividirem um tatu-bola entre todos os combatentes.
O parlamento estadual se viu compelido a destituir as tropas governamentais, fazendo que o chefe policial de Triunfo convocasse os habitantes civis leais para enfrentarem os subversivos que, segundo ele, visavam destituir as forças legalmente constituídas e visando benefícios próprios. Tal ato representou, segundo o pesquisador Marc Jay Hoffnagel, uma desmoralização às autoridades pernambucanas.
A revolta chegou ao fim já em meados de janeiro de 1893, com um número pequeno de batalhas entre os coronéis rebeldes e a polícia estadual. Como descreveu posteriormente Correia da Cruz, "a sistemática adotada pelos legais de tomar por alvo principal as redes de apoio que davam sustentação às forças rebeldes foi decisiva neste sentido" (Hoffnagel, 2010). A falta de apoio do Partido Republicano local também influenciou nas derrotas que vinham se seguindo, refletindo um certo abandono de Martins Júnior, recomendando a Correia da Cruz que desistissem do movimento. Com isso, ocorreu vários saques e repressões pelas forças governamentais em Triunfo, Vila Bela e Afogados da Ingazeira, locais que serviram como base de apoio para os revoltosos. Este movimento, apesar de pequeno e curto, mostra que houve, no momento em que a república ainda criava suas bases nos estados, uma grande participação popular entre os povos do sertão envolvidas nas articulações políticas numa época em que o litoral ainda era visto como o único foco político considerável entre as elites econômicas, em detrimento do interior do país, no qual se costumava ver como territórios "incivilizados".
REFERÊNCIAS
ALBERTIM, Marco. A Revolução de Triunfo. [S. l.], 18 fev. 2011. Disponível em: https://vermelho.org.br/coluna/a-revolucao-de-triunfo/. Acesso em: 16 dez. 2024.
CUNHA, Euclides da. Os sertões. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1952
FACÓ, Rui. Cangaceiros e fanáticos: gênese e luta. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.
HOFFNAGEL, Marc Jay. Tensões e conflitos na consolidação da república em Pernambuco: A Revolta de Triunfo. CLIO: Revista de Pesquisa Histórica, Recife, v. 28, ed. 2, 2010.
José Leite Júnior
Graduando em História pela Universidade de Pernambuco - UPE
junio_chaves@hotmail.com.br
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